O café, o cacau, as montanhas e essas pomposas
vilas que aparecem nas telenovelas colombianas são os principais elementos que
caracterizam a paisagem cafeeira de Pijao, primeiro
povo slow ou povo sem pressa da
América Latina, situado na Cordilheira Central da Colombia.
Este lugar, declarado pela UNESCO Patrimônio
Cultural da Humanidade em 2011, destaca-se por sua arquitetura colonial e sua
grande biodiversidade. Pijao é um povo típico que atrai cada vez mais turismo;
porém, o que é um município slow ou
sem pressa?
Nas primeiras páginas do imprescindível ensaio do
jornalista Carl Honoré, Elogio de la Lentitud (RBA, 2005), o autor
canadense pergunta o que é que se faz primeiro ao se levantar pela manhã.
Por acaso, corre as cortinas? Pergunta. De maneira
nenhuma: a primeira coisa que uma pessoa faz antes de se levantar da cama é
consultar a hora, porque “todo mundo sofre da doença do tempo”.
Segundo Honoré, entramos na era da velocidade há
150 anos, com a revolução industrial, em um viver depressa não como forma de
viver mas de sobreviver. Por sorte, a sociedade se rebela e em muitos países se
instauram organizações e movimentos cujos manifestos se concentram na desaceleração do tempo e das relações
sossegadas com certas tintas hedonistas.
Lentidão
para o “bem viver”
O movimento Cittaslow integra, nos dias
atuais, 199 povos que têm em comum
deslocar-se do frenetismo cotidiano e do hiperconsumo apresentando um estilo de
vida sustentável e harmônico com o entorno.
Nutrindo-se do movimento Slow Food (comida sem
pressa), um presságio que teve o cozinheiro italiano Carlo Petrini quando viu
que o imperador da comida rápida McDonalds se instalava em Roma, Cittaslow se
configurou desde 1999 da mão de Pablo de Saturn, o então prefeito de Greve in
Chianti, na Toscana italiana, como uma proposta que partia da vontade política
para o “bem viver”, filosofia já praticada
pelos povos originários da América – Sumak Kausay – que hoje em dia, inclusive,
se guarda como um direito na
Constituição da República do Equador, de 2008, e do Estado Plurinacional da
Bolívia, de 2009.
A Rede de Povos Sem Pressa é uma oportunidade que
traz muitas possibilidades para apostar num plano de governo diferente do
modelo de desenvolvimento neoliberal, tratando-o de um ponto de vista endógeno.
Monica Flores, propulsora da Fundação Pijao
Cittaslow, afirma que o importante é “a atitude de vida do cidadão do comum
frente a água, os resíduos, a alimentação, a semeadura e recuperação das
sementes nativas ou a contaminação auditiva”.
Tal e como expõe a carta de apresentação do
movimento, trata-se de buscar o melhor do conhecimento do passado para
aproveitá-lo graças às melhores possibilidades que oferecem o presente e o
futuro.
Para fazer parte da Rede, os povos aspirantes não podem superar os 50 mil habitantes e
devem se comprometer em trabalhar as distintas áreas das quais é necessário
certificar-se por um comitê coordenador.
As temáticas referidas são meio ambiente,
saneamento básico, gastronomia local, energia renovável, arquitetura tradicional
e educação pensada para cada um dos cidadãos.
Pijao, povo
caracol
Nos anos 90, esse povo do Quindío se dedicava
exclusivamente ao monocultivo do café apesar da vasta diversidade biológica do
território. Depois do grande terremoto do ano de 1999, que devastou a região, a
corrupção se aproveitou durante décadas dos recursos públicos que recebia e que
nunca se investiram no progresso do município, deixando o campesinato
absolutamente arruinado.
Monica Flores explica que desde a Fundação se “propuseram
devolver a um povo que ninguém conhecia, uma imagem positiva nacional e
internacional. Agora aparecemos nas principais páginas de alguns periódicos
como The New York Times”.
Em 2006, o que tinha que ser um projeto de turismo
rural evoluiu para o que é hoje Pijao, um lugar onde se fomenta o intercambio
de produtos e serviços entre seus habitantes, uma relação que supera o
estritamente econômica, ou seja, “tudo isso que se perdeu pelas sociedades
aceleradas, industrializadas e de consumo”. Em 2014, Pijao passou a formar
parte da Rede de Povos Slow como o primeiro município sem pressa da América
Latina.
A primeira ação que realizou a Fundação Pijao
Cittaslow foi um trabalho de educação
com a cidadania sobre o valor do patrimônio arquitetônico, histórico,
cultural e ambiental, e fortalecer alguns grupos da sociedade civil para impulsionar
os princípios slow ao nível político.
Atualmente, a dificuldade que o povo enfrenta é que cada legislatura deve
ratificar o projeto Cittaslow, de maneira que é uma constante luta para
comprometer os políticos.
Todavia, um município slow deve enfrentar-se com suas fortalezas mas também com as suas
vulnerabilidades concretas para seguir progredindo. Pijao está altamente ameaçado pela mineração, com
23 títulos sobre o deserto do Chilí e 90% do território está concedido à
empresas estrangeiras.
A fundadora de Cittaslow Pijao destaca que “o
objetivo agora é voltar a fazer um processo de reeducação cidadã para que seja
ela quem exija às autoridades locais que queremos seguir sendo um povo sem
pressa. Este é um ano político e temos planejado realizar um fórum de debate
com os candidatos onde eles expressem seu compromisso com Cittaslow”.
A Rede de Povos Para o Bem Viver está presente
também num total de 30 países da Europa, Estados Unidos, China, Austrália e
África do Sul, entre eles o Estado Espanhol, onde os municípios de Begur, Pals
(Girona), Mungia, Lekeitio (Vizcaya), Rubielos de Mora (Teruel) e Bigastro
(Alicante) conseguiram certificação. O movimento segue crescendo lentamente e
se pressente, sem dúvida, um grande porvir, onde muitos lugares de todo o mundo
esperam com paciência ser um povo sem pressa.
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