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Mostrando postagens de 2022

A era do espírito de seriedade

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Artigo de Amador Fernández-Savater , publicado em CTXT - Contexto y Acción , em 11/10/2022. Tradução: Haroldo Gomes.   As identidades, em vez de serem tomadas como ponto de partida, são consideradas hoje como ponto de chegada. O outro é o que é a priori – homem/mulher, heterossexual/homossexual, branco/negro, classe média/popular – e não o que poderia ser Há um homem sério como um papa.   Há aquele sorriso e aquela voz falsa como a dos anjos . (L. Aragon )   O que acontece, o que acontece conosco, quando participamos de um movimento de emancipação, em qualquer escala? Eu diria que se produz, em nós e na própria sociedade, uma abertura, um deslocamento . Saímos das categorias nas quais estamos normalmente presos: sociológicas, geográficas, profissionais. Há um encontro entre aqueles que não estavam destinados a se encontrar e a criação coletiva de novas formas de habitar o mundo, novas formas de vida. Operários e estudantes no maio de 68, piquete e panela na Argentina d

A última partida de Ernesto Guevara (1)

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  Artigo de Miguel de Lucas, doutor em literatura espanhola, publicado em CTXT Contexto y Acción , em 15/07/2022 . Tradução: Haroldo Gomes. O Che não só desistiu de uma carreira promissora como médico. Ele também poderia ter se dedicado profissionalmente ao xadrez. Não era um hobby, nem um passatempo. Jogava muito e jogava bem. ABERTURA Ele viajava com mais livros do que roupas, e costumava levar um tabuleiro com ele. “Na guerra, para ele o jogo de xadrez era imprescindível tanto quanto o fuzil. Sempre tinha seu jogo e buscava alguém para ensiná-lo (…) E realmente, a guerra de guerrilhas propiciava isso a ele”. Conta Harry Villegas Tamayo, um dos veteranos que percorreu o mundo, de Cuba até o Congo, lutando sob as ordens do guerrilheiro argentino Ernesto Guevara de la Serna. Villegas, aliás Pombo, lembra que quando o Che chegou a Bolívia, “a primeira coisa que perguntou foi: vocês trouxeram alguns jogos de xadrez e livros?; ele nos havia dispon

“Vivemos submetidos a uma cruel tirania do gozo permanente”

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Entrevista feita por Amador Fernández-Savater / María García Pérez / Oche Zamora com Fernando Martín Adúriz , psicoanalista, autor de La ansiedade que no cesa (Xoroi, Barcelona, 2018) e Por qué se escribe. Cinquenta escritores (M.Gómez, Málaga, 2022), publicada no portal ctxt.es , em 7/6/2022. Tradução: Haroldo Gomes. O ponto de partida da teoria crítica, diziam os situacionistas, é a insatisfação. Nessa época, os anos sessenta, tratava-se do mal estar de uma vida submetida à repressão: na casa, na escola, na fábrica, no quartel. Sociedade disciplinar. E hoje? O mal da época, sem sombra de dúvida, são as crises de ansiedade e as crises de pânico. De que nos falam? O que nos dizem do mundo que habitamos? O mal estar social, intensificado na época da pandemia, recentemente ultrapassou os umbrais do mainstream . Fala-se sobre eles no Parlamento e na televisão, figuras conhecidas aparecem perante o grande público mostrando o lado b do êxito: depressão, exaustão, ansiolíticos. No entan

Uma editora como máquina de guerra: Guy Debord e a subjetividade leitora

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Texto de Amador Fernández Savater, publicado em Lobo Suelto , em 3/5/2022. Tradução: Haroldo Gomes. “ Para saber escrever é preciso saber ler e para saber ler é preciso saber viver” (Guy Debord) Guy Debord foi um revolucionário durante toda a sua vida. Nos anos 60, para subverter a realidade, Debord faz parte de um grupo revolucionário: a Internacional Situacionista (IS). A IS concebe a si mesma como a expressão mais elevada das forças revolucionárias da arte e da cultura: “nossas idéias estão em todas as cabeças”. Nos anos 80, para organizar a resistência, Debord faz parte de… uma editora. Champ Libre , fundada pelo empresário Gérard Lebovici no rastro do cometa do maio francês. Debord se envolve progressivamente nela a partir de 1972, quando reedita La sociedade del espectáculo . Champ Libre é para o Debord dos anos 80 o que a IS foi nos anos 60: uma arma para ferir a sociedade do espetáculo. Mas, como uma editora pode ser equivalente, de alguma forma, a um grupo revolucionário? O